quarta-feira, 14 de novembro de 2012

O Burro do espanhol não comeu morreu

O burro do espanhol
OPINIÃO
14/11/12, 09:48


Por Paulo André*
Contam os nossos avós que um certo agricultor, passando a fronteira de Espanha, se terá queixado ao seu amigo espanhol de que as colheitas iam de mal a pior e que já nem davam para alimentar os animais de carga.


Este de imediato lhe propôs um negócio: vender-lhe uma raça de burro que, com o tempo, habituar-se-ia a não comer, contribuindo para a diminuição das despesas. Regressado a Portugal, depressa começou com o plano de emagrecimento, que começava por alimentar o animal, dia sim, dia não, até que chegasse ao ponto de o animal não comer. Algumas semanas depois, mostrava todo orgulhoso o burro aos seus vizinhos dizendo: vejam só, a última vez que comeu foi há quatro dias. Mais umas semanas e posso garantir-vos que se habitua e deixa de precisar de comer. Os dias passaram e a dieta intensificava-se e o agricultor passeava. De repente, a ladeia deixou de ver o agricultor e o burro. Estranhando ausência prolongada, um vizinho bateu à porta do agricultor e perguntou "Está tudo bem consigo, vizinho? E o burro, está tudo bem com ele?". O agricultor, em lágrimas, responde-lhe "Ai vizinho, que desgraça, não quer você acreditar que o raio do burro morreu? Logo agora que já se tinha habituado a não comer".
Esta história, passada de geração em geração, continua atual. Portugal é o burro. Estamos a emagrecer. E posso garantir-vos que temos margem para emagrecer ainda mais. Estamos a reduzir as despesas (publica e privada). E posso garantir-vos que temos margem para reduzir ainda mais. Estamos a emigrar. E posso garantir-vos que ainda há muitos por cá, com vontade crescente para emigrar. Estamos a despedir. E posso garantir-vos que ainda há muitos portugueses por despedir. Estamos a ficar mais pobres. E posso garantir-vos que ainda é possível ficar mais pobre.
Mas é esta a solução? Por certo não. Tal como o burro precisa de comer, também as empresas precisam de mercado, de vendas, de financiamento. Não é preciso andar na escola para saber que dinheiro faz dinheiro, que o que custa é o primeiro milhão e que, em casa onde há fome, todos ralham e ninguém tem razão.
Não faço diagnósticos macroeconómicos. Não sou académico, cresci profissionalmente dentro das empresas, deram-me muito e ensinaram-me tudo o que sei. Não dou sugestões. Aliás, todos sabemos que não há uma só solução, não há um só caminho, não há uma só alternativa. Mas as soluções estão por aí. Basta ler um livro, um jornal, uma revista, ligar a TV ou a Net. Todos as conhecemos: identificar os setores críticos; criar um banco de investimento; incentivar a exportação; identificar novos mercados; promover a marca Portugal; defender as PME; promover as fusões e aquisições; restringir as situações de monopólio; incentivar o investimento nacional e estrangeiro; incrementar a eficiência do estado; promover o ensino técnico-profissional. E trabalhar e poupar. Querem mais soluções? Estou certo de que, com cinco minutos de esfoço, conseguem listar uma série infinita de outras soluções.
Mas porque falhamos então consecutivamente? Melhor do que ter uma estratégia é implementá-la. Falamos muito e fazemos pouco. Não nos estamos a revelar um povo de ação. E também não percebo como conseguem dez milhões de portugueses aturar os que nos desgovernam com estratégias partidárias.
Já só peço que não se insista na solução mais fácil. Cortes e mais cortes. Está na hora da ação. Acabem com o emagrecimento das empresas. São elas que nos pagam o salário e que criam riqueza.

Artigo: Jornal OJE

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