quarta-feira, 21 de agosto de 2013

A Banca e o povo Banqueiro

                    
         


         

pluma caprichosa 
Além de eleitores, passámos a banqueiros, caramba, se isto não é uma promoção... Passámos da banqueira do povo para o povo banqueiro
NÃO AGUENTO MAIS BOAS NOTÍCIAS. É um arraso, como se diz na Quinta do Lago. Todos os dias sou dona de mais um banco. Todos os dias. Fiquei com o BPN e parece que com um banco em Cabo Verde que tem o bonito nome de Insular, Banco Insular de Cabo Verde, fiquei com o Banif, que anuncia nas Amoreiras, na parede lateral de um prédio, com um imenso cartaz desbotado pelos ventos, um amoroso cartão de crédito Hello Kitty, um sinal de maturidade financeira, ter um cartão de crédito do gatinho Hello Kitty, e agora vou ficar com o BPP. No problemo, como dizem os mexicanos emigrados e os gangsters, o Estado injeta mais uns milhões de euros, aí uns 400 e tal, quase 500, mais milhão menos mi­lhão, e ainda fica em casa porque o banco tem "disponibilidades". Lendo por alto fiquei com a impressão de que também passei a ser dona de um banco nas ilhas Cayman, o BPP Cayman, e se já adorava a ideia de um banco cabo-verdiano, Cabo Verde tem umas praias lindas, a ideia de um banco nas ilhas Cayman adoro, positivamente adoro. As ilhas Cayman são o máximo. Digo Cay­man porque dizer ilhas Caimão tira-lhes um certo chique. 
Há umas minúcias a propósito do BPP Cayman, essa maçada que agora se chamam imparidades e que são mais ou menos umas massas que não são para reaver, significando que quem ficou com elas fez muito bem, mas existem verbas que provêm da "reavaliação de ativos pela massa falida", verbas "depositadas em bancos nacionais", "verbas aplicadas em diversos ativos, parte da dívida pública", etc. Demonstra-se o ótimo investimento que é comprar a dívida pública portuguesa porque todos ga­nham dinheiro, sobretudo os bancos. Os portugueses pagam sempre as suas contas, portanto a dívida pública é um garante, há money, há cheta. Há cheta para tudo que tenha banco no nome, com ou sem Comissão Liquidatária. Claro que é um bocado seca sacar dinhei­rinho a reformados com pensões superio­res a 600 euros (600? para cima de uma fortuna), mas aquele dinheiro é certo, pode contar-se com ele, e isso é muito bom, chama-se ajustamento. Depois, se todos temos de pagar impostos, a verda­de é que somos todos também donos destes bancos exóticos e dos outros bancos que compram dívida pública e a revendem com lucro e que têm depósi­tos do BPP nos cofres. É tudo meu, nosso. Tirando os 35 milhões que são da Zenith SGPS, fundada por João Rendeiro e uma das credoras do BPP, o banco falido do dito Rendeiro. Fica em casa. A dívida pública somos nós, houve aque­la cena dos swaps, que ninguém percebe e acho que quem não percebe não se deve meter no assunto e deixar isso com os profissionais que vestem bons fatos e passam férias nas ilhas Cayman. Pois se eles recebem comissões e bonificações para tratarem destes assuntos maçadorís­simos por nossa conta e por conta dos nossos políticos, que andam
carregados de trabalho. Os países não acabam, diz o povo, e enquanto nós pagarmos não acabam mesmo e podemos ajustar-nos à vontade. Além de eleitores passámos a banqueiros, caramba, se isto não é uma promoção... Passámos da banqueira do povo para o povo banqueiro. Podem dizer, na Islândia isso não deu mau resultado? Deu, mas regressaram à pesca do bacalhau, uma coisa linda de se ver. Passaram da Bolsa para a pesca do arenque e demais peixes de águas frias, mas estão muito mais felizes e nós, quan­do se acabar a guita para os bancos também podemos regressar à condição natural de povo simples, honrado, um pouco manhoso, que descobre a cabeça quando passa um banqueiro ou um político e trata toda a gente com uma gravata por senhor doutor. Um povo de pescadores e agricultores com filhos emigrantes. Foi assim que vivemos e vivemos muito bem. Chama-se ajustamen­to, justamente. É melhor que ir desmatar. A grande diferença é esta: votamos. E o voto é o nosso doce, a nossa sobremesa, o nosso brinde, o nosso osso. Votamos, e como nos fartamos de votar, pelo menos de dois em dois anos, usamos o privilé­gio. É bom, é bonito. Está pago, e se está pago é para consumir. Podem vir dizer que votamos sempre nos mesmos, os que só têm dois neurónios funcionais e compram swaps em nosso nome a tipos que depois de venderem swaps e engana­rem o Estado vão para um poleiro no Estado, mas é essa a beleza da democra­cia. Não são os swaps deles, são os nossos swaps, é tudo nosso. É sacrifício reparti­do. Por isso venha o BPP, e venham outros, venha a Caixa, venham os que quiserem, nós pagamos, nós podemos pagar. Podemos pagar tudo, os bancos falidos e os políticos falidos, falhados e reformados, porque temos eleições para o mês que vem, e depois outras, as legislativas, e mais as presidenciais, tudo com amigos nossos a concorrer, e podemos ainda ter as europeias. Querem mais? Vão mas é para as ilhas Caimão, a verificar os débitos. Por: CLARA FERREIRA ALVES/REVISTA 17 AGOSTO, 2013




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