domingo, 10 de novembro de 2013

Austeridade Dívida Reformas Insolvência

                     

                        
                       

                       



Cavaco "está a fechar os olhos à realidade" sobre a dívida

Paul de Grauwe acredita que Portugal não deverá fugir à reestruturação da dívida e "masoquismo" é punir-se com mais austeridade. Para o economista belga foi criado o "mito" da necessidade de reformas estruturais.

"Claro que temos de ser mais eficientes, mas o problema é que mandamos abaixo a procura e em resultado a economia não cresce", defende Paul de Grauwe


O economista Paul de Grauwe considera que Portugal não deverá conseguir fugir a uma reestruturação da dívida e que não é masoquismo os portugueses discutirem este tema, mas continuarem a punir-se a si mesmos com mais austeridade.
"Portugal tem tanta austeridade que a dívida se tornou insustentável, algo tem de ser feito. Não acho que consiga sair do problema hoje sem uma reestruturação da dívida", disse em entrevista à Lusa o economista belga e professor na London School of  Economics, que considerou que o Presidente da República, Cavaco Silva, está a "fechar os olhos à realidade" quando considerou que é "masoquismo" dizer que a dívida portuguesa não é sustentável.
"Claro que se deve falar disso. Estão a transferir receitas para os estrangeiros, que sentido faz isso?", questionou o economista, para quem é "quase masoquista" os portugueses "punirem-se a si mesmos".
Na sua opinião, "é difícil entender como pode o Governo magoar a população e sentir-se orgulhoso disso".
"Um novo programa de austeridade vai empurrar Portugal para a insolvência"
Em Lisboa para participar na conferência que assinala os 25 anos do INDEG, a escola de negócios do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa, o economista lembrou que há uns anos Portugal era um país solvente. No entanto, as políticas de austeridade  levaram à recessão económica e aumentaram de tal forma o endividamento que agora corre o risco de não conseguir pagar a sua dívida.
"Um novo programa de austeridade vai empurrar Portugal para a insolvência", antecipou, considerando-a "inevitável" quando o país "foi posto numa austeridade tão intensa que se tornou contraprodutiva" para a economia.
"Dizem aos portugueses que têm de fazer mais sacrifícios. Para quê? Para pagar a dívida aos países ricos do Norte [da Europa]. Isto será explosivo, os portugueses não vão aceitar isso indefinidamente", antecipou.
Paul de Grauwe defende que numa eventual reestruturação da dívida sejam envolvidos não só os credores privados, mas também oficiais, caso do Banco Central Europeu (BCE).
A dívida pública de Portugal chegou aos 131,4% do Produto Interno Bruto (PIB) no final de junho, segundo o Banco de Portugal. O Governo previa que, este ano, a dívida das administrações públicas atingisse 122,3% do PIB, mas entretanto reviu em alta esse  valor para 127,8%. Em junho de 2011, pouco depois de Portugal ter recorrido à ajuda externa, a dívida era de 106,9% do PIB, ainda assim bem acima dos 71,7% do final de 2008.
Problema está do lado da procura
A necessidade de reformas estruturais em Portugal é um "mito", disse Paul de Grauwe, para quem essa solução ignora que é a falta de procura que provoca a recessão da economia.
"Foi criado o novo mito de que temos fazer reformas estruturais. O problema hoje não está do lado da oferta da economia e as reformas estruturais lidam com isso. Claro que temos de ser mais eficientes, mas o problema é que mandamos abaixo a procura e em resultado a economia não cresce. Temos de alterar isso", defendeu.
Para o economista, o que se passa é que os líderes que definem as políticas económicas "foram educados  nos anos 70, em que o problema era do lado da oferta da economia", e não perceberam que a crise económica que a Europa atravessa é de uma dimensão diferente.
"Vocês [em Portugal] fizeram reformas estruturais, flexibilizaram, reformaram o mercado trabalho e não resultou. Porque o problema está do lado da procura", explicou o académico.
Paul de Grauwe entende que Portugal cometeu o "erro" de ser o melhor aluno da troika, quando a economia estaria melhor se assim não fosse, e defende um lóbi do Sul da Europa para mudar políticas europeias.
"O governo português fez o grande erro de tentar ser o melhor da turma no concurso de beleza da austeridade. Não havia razão para Portugal fazer isso, podia não ser o melhor da turma, podia ser mesmo o pior e isso seria melhor para economia", frisou.
Países do sul deviam unir-se 
Portugal tinha de levar a cabo medidas para reduzir a despesa, mas ao longo de mais anos, de modo a suavizar o impacto económico.
Até economistas do Fundo Monetário Internacional (FMI), afirmou, já perceberam que não é possível "fazer a austeridade toda ao mesmo tempo", enquanto na Europa os líderes continuam imutáveis.
"Portugal e outros países do Sul da Europa deviam unir-se e dizer que a maneira como os tratam não é aceitável. Quando Portugal, Grécia, Irlanda e Espanha levam a cabo medidas de austeridade, os outros países do Norte da Europa deviam fazer o inverso e estimular a economia. Vocês têm influência na Comissão Europeia, mas não a usam", disse Paul de Grauwe.
Para o economista, se os países com contas públicas mais fortes fomentassem a expansão, isso contrariaria a contração orçamental dos países da periferia, equilibrando a economia europeia.
"A Zona Euro tornou-se um sistema em que a nações creditícias mandam. Mas a responsabilidade da crise não é só dos devedores, mas também dos credores. Por isso, a Comissão Europeia devia intervir no interesse dos credores e também dos devedores", considerou ainda.
Limite ao défice na Constituição "sem sentido"
Sobre se deve ser colocado um limite ao défice e endividamento da Constituição portuguesa, Paul de Grauwe rejeitou de imediato, considerando que "não faz qualquer sentido", já que haverá sempre períodos em que os países têm de aumentar o seu  endividamento para acomodar as crises cíclicas e proteger os cidadãos.
"O capitalismo é um sistema fantástico, mas muito instável, que produz altos e baixos, períodos de otimismo e pessimismo, e nos baixos o Governo tem de juntar as peças e os défices necessariamente aumentam. Precisamos de Governos que protejam os  cidadãos, que os ajudem [quando estão mal]. Se não o fizerem, a legitimidade dos Governos fica em causa", explicou.
Fonte: Lusa/Expresso 10 de Novembro de 2013




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O chumbo do PEC IV:
“Uma crise de liquidez tornou-se uma crise de solvabilidade”

Vale a pena ler as entrevistas que Paul De Grauwe, professor da London School of Economics e ex-consultor do Banco Central Europeu e da Comissão Europeia, deu na sua última passagem por Lisboa. De Grauwe diz tudo o que tem sido abafado pela propaganda do Governo. Talvez falte nestas entrevistas a explicação para a circunstância de o Governo querer ser o melhor aluno da troika: o ataque desenfreado aos direitos laborais, o ataque sem precedentes ao Estado Social (“totalitário”, chama-lhe Aguiar Branco). Faltou desmontar por que quer o Governo “ganhar o concurso de beleza da austeridade”.

A entrevista que o professor da London School of Economics deu à Lusa pode ser lida aqui. Outra que importa ler é a entrevista publicada hoje no Diário Económico (excertos aqui e aqui), em que refuta algumas posições do Governo que o jornalista interiorizou e lhe coloca (“falta de espaço de manobra na Europa”, “ganhar credibilidade na Europa”, etc.). Eis algumas passagens da entrevista:
    O trabalho que Portugal tem que fazer é referido pela Europa e pelo Governo português. Mas não estão os mercados à espera de acção por parte da Europa?
    - Sim, é verdade. É seguramente insustentável continuar a fazer o que tem sido feito, isto é, Portugal carregando o fardo por inteiro da austeridade numa versão extrema. E vem aí mais austeridade. Isto não tem funcionado e, no entanto, o Governo continua a seguir algo que não tem funcionado e que tem o efeito de subir o rácio de dívida. Por isso, o único resultado razoável é os credores admitirem que é precisa uma reestruturação [de dívida], seja por extensão de maturidades ou outra forma. Há várias formas. O que é irrealista é continuar a fazer coisas que não funcionam. A certo ponto a legitimidade do Governo desaparece porque as pessoas não podem ter um Governo que impõe tantos sacrifícios basicamente para ter aplausos de Bruxelas e de Frankfurt. Espero que o Governo perceba que tem de representar os interesses de Portugal.

    Mas Portugal não parece ter espaço de manobra na Europa: o défice ainda ronda os 6% do PIB e o acesso a financiamento no mercado está longe de garantido. Realisticamente que hipótese tem Portugal para mudar a política europeia?
    - Em primeiro lugar, eu percebo que o espaço de manobra para Portugal é limitado. É um pequeno país e é difícil encontrar aliados. No entanto penso que algo pode ser feito. O Governo português - não o povo português - tem tentado ser o primeiro da turma, ganhar o concurso de beleza da austeridade. Isso não tem funcionado.

    Mas não é a forma de ganhar credibilidade na Europa e conquistar flexibilidade para Portugal? 
    - Mas não tem funcionado. Penso que eram uma nação solvente quando a crise começou e foram afectados por uma crise de liquidez que, de repente, vos levou a ter que pedir dinheiro emprestado. Depois foram tão duros com vocês que agora têm uma crise de solvabilidade. O que começou por ser uma crise de liquidez tornou-se uma crise de solvabilidade. Não é realista continuar. Não entendo um Governo que está disposto a fazer mais do que a Comissão Europeia, que estava disposta a fazer as coisas de forma mais suave com vocês.

    (…)

    Mas aqui o que transpira da informação que vai saindo do Governo é que a 'troika' [da qual a Comissão Europeia faz parte] não está disposta a flexibilizar o défice, por exemplo. As autoridades portuguesas podem tentar negociar fora do espaço público, algo que não passa para fora.
    - O Governo tem agora, por exemplo, um novo programa de austeridade, com cortes de mais de 2% do PIB. Não devia fazê-lo. Devia dizer "não continuaremos a fazer algo que vai prejudicar a economia e que não leva ao resultado que vocês, como 'troika', querem ter". Vamos dizer que não funciona. Porque temos de fazer coisas que não funcionam?

    Se o Governo português disser "não" à troika que resultado pensa que haverá a seguir?
    - Keynes uma vez disse que se dever ao banco mil libras está metido em sarilhos. Mas se dever um milhão de libras, o banco está em apuros. Vocês têm de jogar esse jogo.

    (…)

    Porque lhe parece que hesitam [Comissão Europeia, BCE e Alemanha]?
    - Algumas destas pessoas estão a lutar a guerra anterior a esta, a guerra da inflação. A inflação é menor que 1%. Não há perigo de inflação, o oposto [deflação] é que é verdade. E ainda assim eles hesitam. É vergonhoso que seja assim e prejudica-vos, aos países do Sul. Isto é a parte do BCE. A outra parte é a da Comissão Europeia e da Alemanha. Essencialmente o sistema tornou-se num em que os credores mandam e ditam aquilo que tem que ser feito, sendo que ao mesmo tempo são igualmente responsáveis pela crise. Por cada devedor irresponsável há um credor irresponsável. A responsabilidade partilhada significa que os ajustamentos devem também ser partilhados. No entanto, não é isso que vemos. As nações credoras puseram todo o fardo do ajustamento sobre vocês e a Comissão Europeia tornou-se no agente das nações credoras. Não vos representa, não representa os interesses das nações europeias como um todo, só os das credoras. Isso deve mudar. E deviam dizer-lhes que a Comissão Europeia devia começar a mandar troikas para Berlim. E dizer-lhes: "Vocês não estão a cumprir as políticas correctas e estão a prejudicar outros países." Mas eles têm medo. Por: Miguel Abrantes/Câmara Corporativa



Retrato do neoliberalismo e a dilapidação do bem público
Esta imagen es una perfecta definición del neoliberalismo, es decir individualismo, egoismo y la busqueda del bien privado a costa de destruir el bien común

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