domingo, 22 de setembro de 2013

Televisão Italiana Troika e Portugal

Televisão italiana retrata um Portugal em crise e com fome
20 Setembro 2013, 09:00 por Jornal de Negócios | jng@negocios.pt
Um ano e meio depois a Rai Tre voltou a Portugal. Desta vez, além de um país entristecido, feito de contrastes entre pobres e ricos, a estação de televisão  
 italiana diz ter encontrado um país desiludido, sem esperança e, muitas vezes, sem ter o que comer.
O programa de reportagens “Presa Diretta”, emitido na RAI TRE e apresentado por Riccardo Iacona, quis avaliar a evolução portuguesa desde a última reportagem feita há cerca de um ano e meio, e passados dois anos e meio desde a chegada da troika a Portugal. As reportagens de investigação levadas a cabo por este programa não se coíbem de assumir uma posição ideológica perante os factos relatados.

A matéria reportada pela jornalista Lisa Iotti, depois da visita em Maio deste ano, indicia uma crescente preocupação e alarme entre os portugueses. Desde manifestações dos CTT e dos estivadores, passando pelas filas sem fim dos centros de emprego e da segurança social, até às conversas com figuras conhecidas ou meros anónimos, as imagens transmitidas há poucos dias em Itália transparecem um país depauperado onde a fome vai substituindo paulatinamente a revolta.

programa emitido pela Rai tem uma duração de duas horas, chama-se "basta d'austerity" e descreve a situação que se vive em vários países, incluindo Alemanha, França e algumas zonas de Itália, além de Portugal. 

Na introdução à peça sobre Portugal, o apresentador Riccardo Iacona previne sobre aquilo que se seguirá: “Vamos ver como os nossos irmãos portugueses estão a passar pelo inferno da austeridade”. A surpresa da jornalista ao mostrar os salários entre 400 e 500 euros, publicitados nos escaparates de um centro de emprego na Amadora, é o lado mais positivo da reportagem. 

Apesar de possuir casa própria, as dificuldades de um casal cinquentenário, que vive com 25 euros por semana, justificam a “vergonha de sair à rua”. Será a vergonha de estar desempregado que leva centenas de portugueses por dia ao consulado de Angola. Lisa Iotti conta que as “ex-colónias são o destino de muitos portugueses, onde se contam muitos licenciados”.

Fome
O fundador da AMI, Fernando Nobre, revela que “nos primeiros três meses deste ano tivemos o mesmo número de pessoas, nos nossos centros, que tínhamos tido no primeiro semestre de 2012”. O cenário adensa-se quando Isabel Jonet, presidente do Banco Alimentar, revela que “mais de 10% da população passa fome. Milhares de pessoas, em Portugal, não comem, pelo menos, um dia por semana, porque não têm dinheiro. Muitas crianças só comem uma vez por dia”. Uma idosa diz que almoça nestes centros de apoio e sempre que não consegue guardar os restos para o jantar, espera até ao dia seguinte para voltar a comer. “Estamos muito preocupados porque se continuarmos assim, em poucos meses, não vamos ter capacidade de resposta a todos aqueles que a solicitarem”, lamenta Fernando Nobre.

Privatizações e Troika
O conselheiro de Estado Bagão Félix garante que as privatizações “não resolvem os problemas económicos e ainda enfraquecem a soberania do país”. Um trabalhador dos CTT, filmado durante um protesto, considera que em Portugal se “foram os anéis e os dedos”. “No momento em que, por exemplo, as águas saiam do controlo do Estado em direcção a investidores estrangeiros, o país perde toda a capacidade estratégica para precaver o seu futuro”, explica o antigo ministro das Finanças do Governo de Santana Lopes.

Pedro Santos Guerreiro, director do Negócios, considera que “os elogios da troika à política económica nacional são muitas vezes ouvidos como um insulto em Portugal” e acrescenta que “onde a troika vê a taxa de juro baixar, os portugueses só vêem a pobreza e o desemprego crescer”. O ex-sindicalista Carvalho da Silva observa que a fuga dos jovens portugueses para o estrangeiro irá criar “uma ruptura entre gerações da qual nunca conseguiremos recuperar”. “Portugal foi a cobaia para uma experiência que não funcionou, mas o mais grave é a falta de esperança”, conclui Santos Guerreiro.

Quando o apresentador Riccardo Iacona fala no “liberalismo desenfreado que está por detrás destas políticas”, aproxima-se da ideia defendida por Carvalho da Silva, quando afirma que estamos perante “uma situação extremamente subversiva”.

O antigo Presidente da República, Mário Soares, que também fora entrevistado aquando da reportagem anterior do programa “Presa Diretta”, sublinha “a importância da Europa acabar com esta fixação pela austeridade”. Depois de se classificar como um “europeísta” avisa que “ou a Europa muda de política ou acaba no abismo”. Bagão Félix insiste numa ideia, muitas vezes repetida pela esquerda portuguesa, quando afirma que “a cura está a matar o doente”.

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